Dois irmãos educados juntos: um artista e outro CEO, como isso é possível?

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Provavelmente você já deve ter visto algum caso em que duas pessoas com histórias muito semelhantes, que estudaram na mesma universidade ou escola, tiveram começos de carreira parecidos, muitas vezes nas mesmas empresas, mas tomaram rumos muito diferentes na vida.

Agora eu pergunto: como dois irmãos criados no mesmo ambiente, com os mesmos pais, estudando na mesma escola e com as mesmas condições econômicas seguem caminhos profissionais tão diferentes? Isso pode de fato acontecer?

Pode, os meus entrevistados desta edição, os irmãos Guilherme Mendes e André Mendes nos provam que sim.

Jean Piaget estudou e explorou muito a influência da percepção individual e mostrou que as interpretações de eventos e ambientes são moldadas pelas estruturas cognitivas únicas de cada pessoa. Embora os irmãos possam compartilhar o mesmo lar, cada um constrói suas próprias narrativas internas, que afetam decisões futuras (livro “O nascimento da inteligência na criança” de 1952).

André (foto: Pablo Contreras) e Guilherme (foto: acervo pessoal)

Diego Godoy: André e Guilherme, muito obrigado por toparem falar para os nossos mais de 44 mil assinantes!

Vocês cresceram sob as mesmas influências e valores familiares. Como acham que isso impactou a forma como cada um enxerga o sucesso e toma decisões profissionais?

André Mendes: Nossos pais nos deram uma perspectiva muito ampla de escolhas. Eles abriram nossos olhos não apenas com seus valores e experiências profissionais, mas também apresentando exemplos diversos através de um círculo de amizades e familiares muito eclético.

Tivemos incentivo para buscar realizações pessoais e profissionais com liberdade, autonomia e responsabilidade. Correr atrás dos sonhos e ser ativo para que eles se realizem sempre foi um ensinamento presente.

Acreditar que é possível fazer o que se ama e perceber o sucesso para além do âmbito profissional, como um propósito de vida, é sem dúvida um motor para as minhas escolhas.

Guilherme Mendes: Desde cedo, nossos pais — principalmente nossa mãe — nos incentivaram a explorar nossa criatividade e nos deram uma enorme dose de autoconfiança. Ela sempre nos lembrava de que não havia limites para o que poderíamos realizar e fazia questão de nos expor a ambientes que despertassem a imaginação. Já o nosso pai, com seu coração generoso e uma postura humilde, demonstrava a importância de tratar todos com respeito, independentemente de quem fossem, e de sempre tentar causar um impacto positivo nas pessoas.

Esses exemplos nos marcaram profundamente. Aprendemos que, para vencer, é preciso combinar criatividade com foco e disciplina, ao mesmo tempo em que se valoriza a simplicidade, a empatia e o bom relacionamento com os outros.

É assim que cada um de nós define sucesso e toma decisões profissionais: acreditando que tudo é possível quando se trabalha duro e mantendo a consciência de que respeito e humildade são valores fundamentais.

Diego: Olhando para as escolhas de carreira de vocês, o que cada um acredita que mais influenciou a decisão de seguir por caminhos tão distintos? Foi uma questão de paixão, oportunidade ou acaso?

André: Paixão e oportunidade! Eu amo meu trabalho! Me identifico como artista desde criança e sempre acreditei no potencial dos meus desenhos como forma de expressão e linguagem. Quando optei pelo design gráfico como curso de formação superior, pensava que seria uma boa base para explorar meu desenho e potencial criativo. No entanto, logo no início da faculdade, surgiu a oportunidade de realizar um projeto de mural, e foi assim que iniciei minha trajetória como muralista, o principal gancho para minha carreira como artista.

Este ano completo 25 anos de carreira, já realizei 36 murais de grande formato, participei de 56 exposições em mais de 9 países e continuo amando o que faço.

Guilherme: Eu sempre sonhei em ser um executivo internacional. Desde criança, imaginava-me viajando para muitos países, vivendo em culturas diferentes e fazendo conexões ao redor do mundo. Comecei ensinando inglês na Phil Young’s, onde pude sentir de perto o impacto positivo que meu trabalho gerava na vida das pessoas: cada aluno, de diferentes idades e propósitos, alcançava novas possibilidades por meio do idioma. Aquilo me trouxe uma satisfação enorme e me motivou a continuar buscando formas de influenciar positivamente a vida de outras pessoas.

Quando comecei a trabalhar em multinacionais, percebi que poderia ampliar ainda mais esse impacto, liderando equipes e gerando resultados por meio de uma gestão baseada em disciplina, atitude e paixão — os três pilares que sempre nortearam meu estilo de liderança. Foi assim que construí minha carreira, aproveitando cada oportunidade que aparecia: fazia programas de treinamento no exterior, participava de processos seletivos competitivos e me mudava para outros países sempre que surgia a chance de crescer e aprender.

Acredito que esse caminho foi traçado muito por paixão, mas também por oportunidades que eu nunca deixei passar. Em vez de permitir que o medo ou a ansiedade me impedissem, eu me jogava de cabeça em cada novo desafio, incentivado pela confiança que minha mãe sempre depositou em mim e pela forma como ela nos criou — sem limitar nossos sonhos. Sinto que essa mistura de atitude, coragem e a disposição de buscar o melhor dentro de mim foram determinantes para eu realizar o sonho de ser um executivo global, impactando positivamente pessoas e organizações ao redor do mundo.

Mural de André Mendes em Londres, Inglaterra (esquina das ruas Mayfair e Belgrávia).

Diego: Apesar de atuarem em áreas tão diferentes, quais habilidades ou características vocês consideram comuns e essenciais para o sucesso nas respectivas trajetórias?

Guilherme:

A principal característica que vejo como ponto comum para o sucesso de ambos é a disciplina. Tanto eu quanto o Andy investimos muita dedicação e foco nas tarefas e trabalhos que realizamos. No caso dele, além do talento artístico, há um respeito enorme pelos prazos, pelos detalhes e pela qualidade do que ele entrega — isso faz dele um artista único.”

No meu percurso corporativo, a disciplina também é a base, pois me permite liderar equipes e projetos com consistência e responsabilidade.

Outro fator que compartilhamos é a paixão pelo que fazemos. Cada um de nós realmente vive e respira o próprio ofício, seja na criação artística ou na gestão de negócios. Além disso, temos atitude: não deixamos as oportunidades passarem, não adiamos o que precisa ser feito e agimos de forma imediata quando o momento exige. A soma de disciplina, paixão e atitude é o que nos impulsiona a manter a excelência em nossas diferentes trajetórias.”

André: Um grande entusiasmo pela vida, pelo trabalho e por novos desafios. Um impulso autêntico pela comunicação e pela escuta, além de um desejo genuíno de superar os limites predeterminados.

Guilherme em evento recente com a Axur, onde é CEO USA & Canadá e Global CRO.

Diego: Como o fato de terem um irmão tão bem-sucedido em uma área tão diferente afeta sua perspectiva profissional? Vocês trocam experiências ou aprendem um com o outro?

André: Sim! Temos um bom diálogo e sempre impulsionamos um ao outro. Mesmo vivendo em universos diferentes, dividimos experiências e apontamos caminhos, tanto nas questões profissionais quanto nas pessoais. Acredito que o sucesso de um irmão é mais que uma alegria: é também um incentivo para o desejo de alcançar voos mais altos. Meu irmão é, sem dúvida, um dos meus grandes motivadores.

Guilherme: Para mim, ter um irmão tão bem-sucedido na área de arte, reconhecido como artista plástico e dono de um trabalho que admiro profundamente, é motivo de grande orgulho. Ao mesmo tempo, me sinto muito inspirado por tudo o que ele constrói nesse universo criativo. Nós trocamos muitas experiências: aprendo muito com ele, seja observando a maneira como ele lida com prazos, como materializa ideias ou até mesmo como busca referências artísticas. Da mesma forma, procuro compartilhar com ele o que vivencio no mundo corporativo, dividindo aprendizados de gestão, liderança e planejamento.

Acredito que ele seja a pessoa com quem mais converso e troco visões. É uma troca intensa e mútua: ele me ajuda a ampliar minha perspectiva criativa, e eu contribuo com insights e ferramentas de gerenciamento que podem ser úteis no universo artístico. Sinto que impactamos a vida um do outro de forma muito positiva, o que me traz uma sensação de realização e de estar completo como indivíduo.

Diego: Por fim, que conselho cada um daria a alguém que está começando a construir sua carreira, seja no mundo corporativo ou artístico, mas ainda se sente perdido sobre qual caminho seguir?

Guilherme: Eu diria para a pessoa se preparar bastante e buscar um propósito, algo que realmente traga felicidade e sensação de impacto. Se você trabalha em algo que faz seu coração vibrar, e faz isso com atitude, paixão e disciplina, o sucesso é consequência, independentemente da profissão ou empresa.

É fundamental ter foco e clareza de onde você quer chegar. Defina metas objetivas, estabeleça um ritmo constante para alcançá-las e esteja aberto a ajustar o curso quando surgirem imprevistos — o que, inevitavelmente, acontece. Mas, acima de tudo, mantenha um objetivo claro na mente e dedique-se a alcançá-lo.

Também acredito muito no poder de gerar impacto positivo nas pessoas que cruzam nosso caminho. Seja em uma conversa informal, em uma apresentação de trabalho ou em um projeto grande, faça o possível para tornar aquele encontro significativo.

Quando nos preocupamos genuinamente em ajudar os outros, criamos uma energia positiva que volta para nós em forma de novas oportunidades e conexões. Em última análise, é esse espírito que nos motiva a tornar o mundo um lugar melhor.

André: O meio artístico é um universo íntimo e infinito. Preste atenção aos seus desejos, abrace os acidentes, encontre inspiração em tudo que permeia sua vida e acredite que é possível continuar mesmo diante das dificuldades e obstáculos que a vida pode apresentar. Para construir uma carreira profissional, “…é preciso estar atento e forte…”. O mercado da arte exige posicionamento, e escolhas precisam ser feitas. Como eu disse, é um universo íntimo e infinito, mas precisamos de referências para não nos perdermos pelo caminho.

Quem são:

Guilherme Mendes é CEO USA & Canada e Global CRO na Axur Cyber Security, contando com mais de 24 anos de experiência em gestão de equipes, vendas, marketing e relações corporativas. Formado em Engenharia Civil pela UFPR e com MBA em Negócios pela FGV, já atuou em grandes multinacionais como PPG, Heineken, Philip Morris International, Anheuser-Busch InBev e HSBC, vivendo e trabalhando em países da América Latina, América do Norte, Europa e Ásia. Ele é casado com Caroline e pai de Lucas e Gabriela, e se orgulha de trocar constantemente experiências com o irmão, um renomado artista plástico, expandindo sua visão tanto em âmbito pessoal quanto profissional.

André Mendes é um artista plástico especialista em murais e trabalha em projetos como artista, muralista e arte educador. Formado em Design Gráfico pela PUCPR possui trabalhos em países como Cingapura, Inglaterra, EUA, dentre outros. Assume a imprecisão que permeia as práticas, e promove encontros e experiências entre técnicas e linguagens. Casado com Priscyla e pai de Celeste e Alice, adora trocar experiências com o seu irmão.